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Fábio Farto Pereira

24 anos Colo-Rectal (Intestino), 2015, Familiar
Fez no passado dia 1 de Abril 6 meses que, tanto eu como a minha família tomámos conhecimento da notícia mais inesperada e triste que poderíamos alguma vez imaginar. Apesar se fazer meio ano no dia 1 de Abril e de desejar que tudo isto fosse um grande mentira, foi das coisas mais reais e marcantes da minha vida! Pode parecer brutal e intenso, mas desde o diagnóstico que a esperança dos médicos não era muita e para alguém com o mínimo de conhecimentos, essa falta de esperança deixava-se transparecer e tornava-se também parte de mim! Lutava, lutava muito para que esse pensamento não ficasse intrinsecamente ligado a tudo isto mas era impossível, cada vez que via a minha tia, cada dia que passava e a via mais frágil, esse pensamento lá estava, como se de uma assombração que nos persegue e fica a cada esquina esperando que seja dado um passo em falso para atacar. No dia 1 de Outubro o cancro entrou na minha vida, através de uma das pessoas mais importantes da mesma, a minha tia.... Cancro!? Pensava eu que estas situações apenas aconteciam aos outros, mas não, estava a acontecer-me a mim e foi algo que mudou a minha vida durante(infelizmente) poucos meses! Nesse dia fiquei com a tarefa de contar à minha avó que a sua filha enfrentava um cancro, mas não podia dizer a alguém tão frágil como a minha Alzirinha que a filha tinha um cancro terminal, não podia ser assim. Então, com toda a frieza e capacidade de desvalorizar as coisas más que me acontecem contei à minha avó que a filha tinha um cancro, não valia a pena esconder, mas que iria ser algo tratável e que com a força que a minha tia tem facilmente o iria ultrapassar! Como único homem da família tive de arranjar todas as forças possíveis e imaginárias para conseguir dar força à minha prima, à minha mãe e à minha avó! Algumas coisas foram sendo ocultadas perante a minha avó para esconder o que estava aos olhos de todos e iam sendo cada vez mais intensas nas visitas ao hospital. Desde aquele fatídico dia 1 de Outubro que o hospital passou a ser a sua casa até bem perto do fim. As visitas todas as semanas, sempre que possível, tornaram-se uma constante e o caminho já era quase feito automaticamente pelo carro! A cada visita lá estava ela com o sorriso a que nos habituou a todos, com aquela alegria de viver, mas que a mim confidenciara estar a perder, e eu ali sem puder fazer nada, sem puder ajudar, mas com uma vontade enorme de dar a minha vida pela dela! Quando estávamos juntos só os dois o sorriso desaparecia e as palavras tornaram-se mais duras com a realidade a abater-se sobre nós e com a certeza que as coisas não caminhavam no sentido positivo! A comida não entrava, o corpo emagrecia, mas sempre que via a minha avó ou a minha mãe o sorriso lá estava e serena ela ficava na cama como se nada estivesse a acontecer. Contávamos umas piadas para abafar o ambiente pesado que se vive naquela ala de internamento onde estão juntas talvez 40 pessoas, partilhando angústias, medos e muitas delas esperanças!! Com o avançar do tempo toda esta situação tomava conta da família, cuja vida era em prol de dar o melhor e de tentar os possíveis e impossíveis. A minha mãe e a minha avó faziam tudo, comida, batidos, mas a fome não existia e o corpo lá continuava a desvanecer...e eu!? Não a podia julgar, não sabia o que sentia, mas sabia que era algo que a estava a tirar de mim, sabia que a ia perder, sabia que cada dia que a via poderia ser o último... Tentava animá-la falando de tudo menos daquilo, não a forçando a nada e tentando que aproveitasse o que lhe restava da melhor maneira possível. Chegou então a notícia que teria de ser transferida para outro hospital.(...) Aqui esteve e a cada dia estava pior, alternando com dias em que parecia não ter absolutamente nada, mas esses eram raros e contam-se pelos dedos de uma mão! Só pensava para mim mesmo "espero por tudo que chegue ao natal", e chegou! Nem quero falar sobre o natal, o mais doloroso de sempre!!! Mas uns dias depois aconteceu...
Lembro-me perfeitamente da chamada logo de manhã e com poucas ou nenhumas palavras percebi e tal como contar a notícia da doença, calhou-me a mim contar à minha avó que tinha perdido uma filha! Eu?? Contar à minha avó que tinha perdido a filha para uma doença sinistra e silenciosa...não foi fácil! Ainda dói muito, escrevo isto como um desabafo que pode ou não ajudar alguém em situação similar mas sobretudo para enaltecer a minha tia como lutadora e como positiva que sempre foi até ao final! Escrevo ainda para valorizar e mostrar a admiração que tenho pela minha prima!!! Não foi uma despedida, foi um até já, sempre de sorriso no rosto! :)
 
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