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102 Quero, logo falo
límpida, bem timbrada e claramente audível não só em ambientes silenciosos
mas também em locais com maior ruído.
Fiquei preocupado quando, algum tempo depois, comecei a sentir sinais
de rouquidão. Trabalhava então como procurador-geral adjunto, na Procurado-
ria-Geral da República. A minha preocupação tinha duas razões fundamentais.
Por um lado, eu era, desde os tempos da minha comissão no Comando Naval de
Angola (1967-1969), um grande fumador. O vício do tabaco adquirira-o já tarde
– com 26 anos, durante o tempo do serviço militar em Angola. Sabia, por outro
lado, que o tabaco estivera na origem do cancro pulmonar que, em 1961, vitimou
o meu pai. Quer isto dizer que eu tinha a consciência exata do efeito canceríge-
no do tabaco, ao qual se somava essa triste experiência de vida. A isso somava-
-se a possibilidade de uma tendência familiar para contrair essa terrível doença.
E era essa a segunda razão da preocupação crescente que me foi invadindo.
Consultei um reputado especialista. Apesar do exame que me foi efe-
tuado por um jovem médico assistente revelar uma inflamação de uma corda
vocal, o certo é que «o mestre» não valorizou o problema: ao invés, ocupou-
-se com as minhas roncopatia e apneia do sono, bem como com uma qualquer
anomalia funcional nos seios perinasais. A fim de solucionar esses problemas,
o médico propunha-se operar-me. Tendo ficado mais tranquilo com a explica-
ção que o médico assistente me deu sobre a existência de uma (simples) infla-
mação numa corda vocal – diagnóstico que me pareceu ter merecido também
a concordância do especialista –, eu não estava tentado a aprofundar a questão
que me levara à consulta. Mas também não dei seguimento à sugestão da cirur-
gia aos seios perinasais.
A minha vida profissional, com os inerentes volume e responsabilidade de
serviço, não me dava tempo para me ocupar comigo. E a rouquidão progredia.
Lentamente… Mas progredia! Foi por isso que, apenas depois da jubilação, em
2003, tratei de dedicar a devida atenção à minha saúde. O passo seguinte levou
à já mencionada intervenção cirúrgica: a excisão da corda vocal (cordectomia),
realizada em março de 2004.
1.2. A recidiva e a laringectomia total
Durante cerca de cinco anos, fui vivendo relativamente bem. A voz nunca
mais voltou a ser como dantes. Não tinha melhorias mas também não tinha uma