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            tive grandes problemas de adaptação e, após uma noite e um dia, voltei à en-
            fermaria pelo meu pé. Também sem grandes dificuldades, cumpri sempre com
            todo o rigor o que me era pedido para tratamento médico. A simpatia e a com-
            petência de todo o pessoal médico e da enfermagem deram-me a garantia de
            que tudo chegaria a bom termo. Ao fim de 12 dias de internamento, estava de
            volta a casa. Tive algumas dificuldades no que diz respeito a tosse e secreções,
            mas, com o tempo, as coisas foram melhorando».
                  José Joaquim dá-nos a sua versão do pós-operatório: «Ensinaram-me a ali-
            mentar-me através duma sonda nasogástrica, o que não foi difícil, e, no dia se-
            guinte, tomei banho sem problema, embora com algum receio por ter um buraco
            na garganta com ligação aos pulmões. Mas não houve problema. Só é preciso
            algum cuidado. Aprendi também sem dificuldade a fazer a limpeza da cânula,
            embora nos primeiros dias tivesse algum receio em introduzi-la, o qual passou
            rapidamente. Tudo corria bem. Ocupava o tempo a ler, a ouvir música e a co-
            municar com amigos e amigas no meu portátil. Dos outros que foram operados
            comigo, fui o único a quem não inchou o rosto e os pontos cicatrizaram rapida-
            mente. Tudo bem, portanto».
                  E eis o testemunho de Manuel Bolas: «O desconforto provocado pela ope-
            ração até não foi muito violento (comparado com o que veio depois, quando
            foram iniciadas as sessões de radioterapia); todavia, a aprendizagem de limpe-
            za, desinfecção e recolocação da cânula, perante um espelho onde se observa-
            va um buraco rodeado de sangue pisado, foi de alguma forma traumatizante:
            “Tem de ser você a fazê-lo!”, afirmavam as enfermeiras, num misto de paciência
            e disciplina “tipo tropa”. Na verdade, não tinha motivos para me lamentar: tinha
            fumado durante pelo menos 47 anos e a fatura tinha de ser paga!». E continua:
            «Regressei ao hospital alguns dias depois [de ter tido alta] para saber o que viria
            depois. E o “depois” foram as sessões de radioterapia […]. Aí começou o verda-
            deiro calvário: a pele queimada, a falta de apetite, a ausência de paladar, a falta
            de saliva. Contava os dias que faltavam para [aquilo] acabar e, quando acabou,
            fiz um balanço: tudo negativo?”.
                  Na verdade, a radioterapia é, na quase totalidade dos casos, uma ine-
            vitabilidade. E é uma experiência dura, com queixas e sequelas bastante pe-
            nalizantes (como se pode ler num outro capítulo desta obra). Passa-se um
            mau bocado, como Manuel Bolas recordou e João Victor descreve: “Seguiu-se
            a radioterapia, e posso dizer que foi o pior período de todo o processo; não só
            pela deslocação diária, de segunda-feira a sexta-feira, como o incómodo doloroso
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