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uMa HIStórIa coM MuItaS eStórIaS dentro 127
[disseram-me]: “Esteja descansado, vai sair de lá a falar!”. Até se perceber alguma
coisa passou algum tempo; é precisa muita paciência e persistência. As sessões
de terapia eram, para os participantes, um local de encontro das frustrações, das
angústias, mas também das expetativas de cada um. Simultaneamente, tornaram-
-se, através da disponibilidade das terapeutas, uma fonte de aprendizagem sobre
a melhor forma de conviver com as barreiras agora existentes, e assim se criou
o ambiente de motivação tão necessário naquela fase».
De facto, a terapia da fala é um desafio à persistência de cada um, mas é
também um convite a uma espécie de socialização diferente: «Há outros como
eu!». Há lições a apr(e)ender, experiências a partilhar.
Isso mesmo é referido por Manuel Bolas: «Por esse tempo, na aldeia de
Palhais, [situada no] Barreiro, onde na altura eu vivia, conheci dois “colegas” de
infortúnio. Quem diria? Numa localidade tão pequena! Ainda partilhámos algu-
mas experiências, se é que se pode chamar “partilhar” a uma linguagem quase
só reduzida à mímica…». E anota, referindo os seus mais característicos inter-
locutores: «A comunicação com os outros continua a ser o maior obstáculo e,
neste particular, encontramos todo o tipo de pessoas: desde aqueles que pura e
simplesmente se recusam a entender-nos – e cada vez que isso acontece é uma
derrota pessoal – até àqueles que fazem um esforço para compreender: “Descul-
pe, pode repetir?”. Este é um pormenor muito interessante, porque na repetição
somos forçados a pronunciar as palavras com mais cuidado e mais lentamente.
Felizmente, alguns pormenores correram bem desde o princípio. A minha mu-
lher, que tem alguns problemas de audição (“Tens de falar mais alto”), os meus
filhos e até a minha neta sempre me compreenderam, e até consigo manter com
eles pequenos diálogos ao telefone. O mesmo acontece com a minha médica de
família, em serviço na uSF do Barreiro e que, sendo ucraniana, teria mais difi-
culdade no entendimento de uma linguagem a que se poderia chamar “atípica”;
tem sido extraordinária no apoio que me tem dado».
Mas há também o MovApLar, o movimento solidário que se empenha no
acompanhamento qualificado dos laringectomizados, procurando aplanar-lhes
o caminho, resolvendo-lhes as dificuldades e minorando-lhes, dentro do possí-
vel, a angústia e a ansiedade. Foi o seu bem-fazer que levou Manuel Bolas aos
seus convívios: «A convivência com outros laringectomizados também foi motivo
pelo qual passei a frequentar as reuniões mensais da MovApLar – secção da Liga
Portuguesa Contra o Cancro dedicada a este tipo de doentes, cujos responsáveis
estão sempre prontos para ajudar todos aqueles que vão chegando ao “universo